Para muitos, a traição de Cristo é visto como algo imperdoável. O que não falta por aí são os “porteiros de Deus”, aqueles que determinam quais são os pecados que são perdoáveis e os que são imperdoáveis, estes últimos, levam à expulsão de membros, outros porém, podem levar a castigos, que podem ir desde uma simples repreensão à retirada das funções na igreja. Eu sei que há pessoas que têm posições e modos de viver não muito dignas, seus exemplos de vida deixam muito a desejar. Essas são considerados por muitos, como joio ou o lobo entre ovelhas.

A maioria das igrejas, numa tentativa de minimizar danos, criaram uma espécie de tribunal interno, concelho de disciplina para corrigir quem não anda nos parâmetros conforme a doutrina de cada igreja. Inclusive, chegam ao ponto de determinarem quem devem ser os amigos da pessoa corrigida, quais os livros que devem ler, qual o pastor que deve receber em sua casa e estão proibidos de falarem com pessoas dissidentes da igreja ou de outras igrejas.

É o concelho de disciplina que determina quem é joio e quem é trigo, bem como, quem é rebelde e quem é lobo. Após a determinação, logo passam uma lista de nomes, para que os membros saibam a quem não devem ter comunhão e muito menos cumprimentar . Usam-se os exemplos do ap.Paulo, que entregou o corpo de alguém a Satanás, os rebeldes que foram engolidos pela terra no tempo de Moisés, do exemplo da irmã de Moisés que ficou com lepra, etc, numa tentativa de coação psicológica, o medo da maldição.

Mas a mim, o que me interessa é olhar para este assunto com o olhar de Cristo. Cristo é a minha chave hermenêutica, ele é o meu exemplo para tudo. Eu leio Paulo através de Cristo, eu leio Moisés e todos os outros através dos olhos de Cristo. E o que Cristo nos diz? Em relação ao Joio, ele diz para deixar crescer junto ao trigo, que não o devemos arrancar, pois corremos o risco de arrancar trigo também: "Deixa-o crescer até ao dia da ceifa". Nesse dia, o Pai enviará seus anjos e separarão os joio do trigo, o joio é separado para ser queimado e o trigo para entrar nos celeiros do céu. Este dia da ceifa, não é somente o dia da volta de Cristo, mas refere-se ao dia da morte de todos. Quando morrermos, a separação é feita, quem joio fica logo a saber.

Quanto aos lobos, ele nos envia ao meio de lobos, tanto medo de lobos para quê? Se ele nos envia, como ovelhas ao meio de lobos. É o carácter da ovelha que a capacita para enfrentar lobos e joio. Não há que ter medo, nem nos cabe a nós o papel de separar o joio e atacar os lobos. Esse papel cabe ao Senhor, ele mesmo diz: “As minhas ovelhas conhecem-me, ouvem a minha voz e seguem-me. Ninguém as pode arrebatar das minhas mãos”.

Se Judas não se suicidasse, será que Cristo criava um conselho de disciplina para o tirar da igreja? Não me parece, pois, Pedro cometeu o mesmo erro que Judas, o negou três vezes e foi acolhido por Cristo. Tenho a certeza que se Judas não se suicidasse seria acolhido de igual modo. Por outro lado vejo Jesus a expulsar os cambistas do Templo, a chamar raça de víboras aos fariseus, filhos do diabo...”qual a diferença? Será que os fariseus não têm a mesma oportunidade do que qualquer outro cidadão do mundo de serem salvos pelo Evangelho, de conhecerem o amor de Deus? Claro que sim, os fariseus têm a mesma oportunidade como qualquer outra pessoa, inclusive, o ap.Paulo foi um fariseu devoto (Filp.3:5-6 / Actos 22:3) e foi salvo. O Evangelho é o poder de Deus para a salvação de todo o homem. Então porquê este tratamento tão duro? Porque quem é mestre receberá mais duro juízo (Tiago 3:1); os fariseus eram os mestres da lei de Moisés, Paulo dizia:”...fui intuído conforme a verdade da lei dos nossos pais, zelador de Deus...”(Atos 22:3). Eles não podiam dizer que não conheciam as escrituras, que não conheciam a graça de Deus, que não sabiam que o Messias viria e no entanto, as negavam, as negavam pelo o modo como viviam e obrigavam o povo a viver, por outro lado, confrontados por Cristo, eles rejeitavam aquilo que sabiam que é a verdade.

Quem lidera e quem ensina tem uma responsabilidade muito grande, porque deveriam saber a verdade e ensiná-la, como também ser irrepreensível. O que vemos actualmente são líderes fariseus que instituem tribunais e conselhos de disciplina para corrigirem pessoas que eles mesmos as formaram. Jesus disse aos fariseus: “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! Pois que percorreis o mar e a terra, para fazer um prosélito; e, depois de o terdes feito, o fazeis filho do inferno, duas vezes mais do que vós.” (Mat.23:15)

Este é o grande problema em muitos movimentos cristãos, percorrem o mundo para converter pessoas a Cristo, mas, infelizmente as convertem à visão deles mesmo, criam discípulos piores do que eles, o líder diz: “esfola” o discípulo diz: “mata”. São os “Yes Man” dos líderes. Jesus diz que são filhos do inferno, os Yes Man, duas vezes piores que quem os lidera, pois querem mostrar resultados para agradar. Esses, se não se arrependerem, receberão muito mais duro juízo. Haverá menos rigor para Sodoma e Gomorra do que para pessoas assim. Mas este juízo, apenas Cristo pertence e não a nós.

José Fidalgo

12/08/2020